terça-feira, 13 de outubro de 2009

i love you until the end.

Seus corações batiam ritmicamente, juntos, iguais, e no momento que um deles parou, o outro desejou imediatamente não funcionar mais...



- Eu quero de flocos, tá?

- Tá! Não fecha o portão, me espera aqui, não vou demorar. – pediu Thiago enquanto entrava no carro, ainda na garagem. Debrucei-me sob a janela e pressionei meus lábios sob os seus.

- Vou morrer de saudades... – choraminguei passando os dedos em seu cabelo.

- Já volto princesa, e trago sorvete! – ele sorriu e me beijou na testa. Thiago sempre me beijava na testa quando nos separávamos. Nunca perguntei porque. Seus olhos penetraram os meus por alguns segundos, e ele moveu os lábios num “eu te amo” mudo.

- Eu te amo mais, muito mais.

Ele finalmente ligou o carro, que deu um ronco cansado. Eu sempre interpretava aquele barulho como um pedido de socorro, mas ele ignorava. Tinha um amor incondicional por aquele carro, que foi o seu primeiro, e não lhe importava que a pintura estivesse descascando ou o assento do banco de trás remendado.

Fiquei observando o carro dobrar a esquina e me sentei na calçada, perdida em meus pensamentos. No quarto, a cama estava desarrumada, os lençóis revirados e na TV, o mocinho do filme permanecia paralisado, esperando que Thiago atendesse meu desejo de comer sorvete com biscoito. O supermercado era a algumas quadras dali, ele preferiu ir de carro para ser mais rápido, afinal, o domingo já estava acabando e na segunda retomaríamos nossa rotina, o tempo para nós dois diminuiria consideravelmente. Uma brisa soprou, arrastando algumas folhas secas na calçada e bagunçando meu cabelo. “Devo estar horrível” pensei.

Usava um vestido xadrez, o meu preferido, confortável o suficiente para passar a tarde em casa vendo DVDs. Meu cabelo estava solto, os cachos se formavam em meus ombros e desciam por minhas costas. Passei os dedos para desembaraçá-lo e sorri, relembrando algumas horas atrás, quando saí do banho e já vestida, me olhei no espelho, fazendo uma careta, sem gostar do que via. Thiago pousou as mãos em minha cintura e sussurrou em meu ouvido que eu estava linda. Virei-me para abraçá-lo e limpei sua bochecha suja de farelo de pão, vestígios do nosso café-da-manhã. Um carro me fez despertar desses devaneios. Parecia um borrão preto, não deu pra ver muita coisa, estava rápido demais. Pouco tempo depois, ouvi uma buzina conhecida e depois um estrondo. Pneus cantaram no asfalto, vidros se estilhaçaram e meu coração deu um solavanco. Senti as borboletas em meu estômago voarem apressadas, procurando a saída mais próxima. O medo percorria todo meu corpo e pus-me de pé num salto, os olhos arregalados de pavor, procuravam alguma resposta, olhando atentos na direção do barulho. Meus pensamentos eram suplicantes. “Por favor que aquele carro não tenha batido em Thiago, por favor!” Então eu corri. O mais rápido que pude e ao dobrar a esquina, vi a cena. O carro preto estava atravessado na rua, quase intacto, não fosse por um arranhão na lateral. O motorista estava saindo do carro, meio atordoado. Mais a frente, um carro vermelho com a pintura descascando, estava em pedaços, abraçado ao poste. Fumaça saía do capô e o pára-brisa tinha uma rachadura enorme, que a qualquer momento podia se despedaçar. Aproximei-me do carro, lágrimas embaçavam minha visão, mas o pouco que vi foi suficiente. Thiago com a cabeça pendendo para frente, desacordado. No banco do passageiro a sacola de supermercado. Tapei a boca com as mãos abafando o grito. Pisquei, para que as lágrimas rolassem e eu pudesse ver melhor. Queria chegar mais perto, chamar até que ele acordasse, mas estava presa ali, com os pés fixos ao chão.

- Eu vou ligar para a ambulância. Mantenha a calma, ele deve estar bem. – alguém balbuciou atrás de mim, provavelmente o motorista do outro carro. Não respondi e nem me importei em virar para olhá-lo. Dei alguns passos a frente, vencendo o medo que me prendia ali e ergui a mão. Toquei em Thiago com os dedos trêmulos e imediatamente eles estavam sujos de sangue. Sua testa tinha um corte profundo e a boca estava entreaberta. Minhas pernas não agüentaram, cederam, e caí de joelhos na rua. A dor da queda não conseguiu ser maior que o medo de perdê-lo. Gritei o mais alto que minhas cordas vocais me permitiam, tentando expulsar o nó que se formava em minha garganta... mas nem o grito foi capaz de desatá-lo. Ouvi ao longe o barulho da sirene e permaneci ali, em choque. Alguém me puxava para trás e eu estava me distanciando dele, joguei-me para frente tentando alcançá-lo, mas os braços que me seguravam eram fortes, e a cada piscar de olhos, Thiago ficava mais longe. Uns homens altos chegavam com uma maca perto do carro. Uma sensação desconhecida percorreu meu corpo, como se o ar não entrasse mais em meus pulmões. De repente, silêncio, escuridão e...


o barulho irritante do despertador.


Alice abriu os olhos molhados, estava tão suada que algumas mechas de cabelo grudavam em seu pescoço e ela ergueu-se na cama, apoiando o corpo com os cotovelos. Uma claridade estranha inundava o quarto, fazendo-a piscar várias vezes para acostumar-se com a luz. Olhou para o lado e o travesseiro que devia estar ocupado, estava vazio. De repente entrou em pânico, temendo que o pesadelo fosse real.

- Thiago? – gritou, sentindo que novas lágrimas já escorriam por seu rosto.

- Amor, porque o despertador ainda está ligado? – perguntou ele, saindo do banheiro, com a escova de dente na mão, enrolado numa toalha, o cabelo ainda pingando nos ombros. – O que houve, porque está chorando? – Thiago deu a volta na cama, desligou o despertador, e abraçou Alice, colocando a cabeça dela em seu peito. Ela aninhou-se ali, deixando o medo ir embora. Não queria lhe soltar mais, podia abraçá-lo assim para sempre.

- Eu tive um pesadelo horrível e pareceu tão real. – lhe explicou entre soluços.

- Por isso estava tão suada, e se mexendo tanto durante a noite. Abri as janelas, achando que estava inquieta por causa do calor. Desculpe, devia ter te acordado, mas é que você já dormiu tão mal na outra noite... – uma ruga de preocupação agora se formava em sua testa. Tudo que era ruim para Alice, automaticamente era ruim para ele também.

- Não se desculpe apenas me abrace. – ela pediu, apertando seus braços com mais força em volta do pescoço dele.

- Posso fazer isso durante toda a minha vida, se você precisar.

- Prometa que vai estar aqui todas as manhãs. - Alice se desprendeu de seu abraço para olhá-lo. Acreditava que promessas só eram promessas, se fossem feitas olhando nos olhos.

- Eu não preciso prometer. É simplesmente impossível que algum dia eu venha a sair do seu lado.